quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

CURSO BÁSICO DE FILOSOFIA (Parte IX) Última parte

RACIONALISMO E EMPIRISMO NA FILOSOFIA MODERNA

O século XVI foi uma época de profundas transformações na visão do homem ocidental, época marcada por verdadeira paixão pelas descobertas.
Essa efervescência, que caracteriza a atmosfera intelectual do Renascimento, trouxe consigo, a rejeição das idéias até então vigentes (o prestígio da Igreja e do Estado foi abalado pelo movimento da Reforma).
O homem europeu descobre que há idéias bem diversas das que vinha aceitando como únicas verdadeiras, e passa a ter descrenças e dúvidas quanto ao conhecimento da verdade, expressando um clima de ceticismo (doutrina que nega toda forma de conhecimento da verdade).
Entretanto, era necessário que se encontrasse o caminho certo. E essa era a preocupação que se generalizou a partir do final do século XVI e que irá caracterizar a investigação filosófica do século XVII e XVIII. Duas grandes orientações metodológicas surgem, então, abrindo as principais vertentes do pensamento moderno: de um lado, a perspectiva empirista proposta por Francis Bacon, a preconizar uma ciência sustentada pela observação e pela experimentação, e que formularia indutivamente as suas leis, partindo da consideração dos casos ou eventos particulares para chegar a generalizações, por outro, inaugurando o racionalismo moderno, Descartes busca na razão os recursos para a recuperação da certeza científica.
Explicando melhor as duas correntes:
O termo empirismo tem sua origem no grego empeiria, que significa “experiência” sensorial.
O empirismo é considerado uma doutrina relativa à natureza do conhecimento. Restringiu-se amiúde o termo “empirismo” à filosofia clássica moderna, contrastando-se o “empirismo inglês” (Francis Bacon, Hobbes, Locke, Berkeley, Hume) com o “racionalismo continental” (Descartes, Malebranche, Spinoza, Leibniz, Wolff).
Indicou-se por muitas vezes que para os empiristas modernos a mente é como que uma espécie de receptáculo no qual se gravam as “impressões” do mundo externo. Quando se comparam entre si as filosofias dos grandes empiristas ingleses verifica-se que isto é uma simplificação excessiva. Entretanto, há algo comum a todos esses pensadores, que é a tendência de proporcionar uma explicação genética do conhecimento e a usar termos como “sensação”, “impressão”, “idéia”, etc..
De um modo geral, o empirismo defende que todas as nossas idéias são provenientes de nossas percepções sensoriais (visão, audição, tato, paladar, olfato). Em outras palavras, ditas por Locke: nada vem à mente sem ter passado pelos sentidos.
O filósofo empirista John Locke afirmava também que, ao nascermos, nossa mente é como um papel em branco, completamente desprovida de idéias. De onde provém, então, o vasto conjunto de idéias que existe na mente humana? A isso, Locke responde com uma só palavra: da experiência, que resulta da observação dos dados sensoriais. Todo nosso conhecimento está nela fundado. Empregada tanto nos objetos sensíveis externos como nas operações internas de nossas mentes, que são por nós percebidas e refletidas, nossa observação supre nossos entendimentos com todos os materiais do pensamento.
Assim, toda idéia é uma cópia de alguma impressão. Essa cópia possui diferentes graus de fidelidade. Para ele toda a realidade deve reduzir-se às relações com que se unem entre si as impressões e as idéias.
Um filósofo que ganhou destaque por seu empirismo “total” é Hume que recorreu a um princípio de que se servirá largamente em todas as suas análises: o hábito (ou costume) (ler texto Investigação sobre o Entendimento Humano, conceito de hábito, p. 145 - Hume), pois quando descobrimos uma certa semelhança entre idéias que por outros aspectos são diferentes, empregamos um único nome para indicar. Forma-se assim em nós o hábito de considerar unidas de alguma maneira entre si as idéias designadas por um único nome; assim o próprio nome suscitará em nós não uma só daquelas idéias, nem todas, mas o hábito que temos de considerá-las juntas e, por conseguinte, uma ou outra, segundo a ocasião.
Dessa maneira, ele é um empirista, no sentido que a percepção repetida e habitual de uma determinada impressão ou fato nos leva a elaborar idéias sobre os fenômenos naturais, através de generalizações indutivas.
As conclusões indutivas são percepções repetidas que nos chegam da experiência sensorial, saltamos para uma conclusão geral, da qual não temos experiência sensorial.
A certeza das proposições que se relacionam com fatos não é, portanto, fundada sobre o princípio de contradição. O contrário de um fato é sempre possível. “O sol não se levantará amanhã” é uma proposição não menos inteligível nem mais contraditória do que a outra “o sol levantar-se-á amanhã”. Por isso é impossível demonstrar a sua falsidade. Todos os raciocínios que se referem a realidade ou fatos fundam-se na relação de causa e efeito.
Ora, a tese fundamental de Hume é que a relação de causa e efeito nunca pode ser conhecida a priori, isto é, com o puro raciocínio, mas por experiência. (ler texto Investigação sobre o entendimento Humano, p. 140 conceito experiência – Hume) Porém, a experiência não nos ensina mais que sobre os fatos que experimentamos no passado e nada nos diz acerca dos fatos futuros. E dado que, mesmo depois de feita a experiência, a conexão entre a causa e o efeito permanece arbitrária, esta conexão não poderia ser tomada como fundamento em nenhuma previsão, em nenhum raciocínio para o futuro. Pois, o curso da natureza pode mudar, os laços causais que nos testemunhou podem não ser verificados no futuro. Desse modo, a experiência diz respeito sempre ao passado, nunca ao futuro.
É o hábito (repetição de um ato qualquer) que nos leva a crer que o sol se levantará como sempre se levantou; é o hábito que nos faz prever os efeitos da água ou do fogo ou de qualquer outro fato ou acontecimento natural ou humano; é o hábito que sustem e guia toda nossa vida cotidiana, dando-nos segurança de que o curso da natureza não muda mas se mantém igual e constante, donde é possível regular-se com vista para o futuro. O hábito, como o instinto dos animais, é um guia infalível para a prática da vida, mas não é um princípio de justificação racional ou filosófico. Assim, partindo do hábito e da associação de idéias é que Hume acredita na causalidade. Mas, por que será que espero ver a água ferver quando a aqueço? É porque, responde Hume, aquecimento e ebulição sempre estiveram associados em minha experiência e essa associação determinou hábito em mim. Aparento antecipar a experiência quando, na verdade, cedo a uma tendência criada pelo hábito.
Assim, ele afirma que a conclusão indutiva, por maior que seja o número de percepções repetidas, não possui fundamento lógico. Será sempre um salto do raciocínio impulsionado pela crença.
Questionando a validade lógica do raciocínio indutivo, o grande valor da obra de Hume foi ter deixado um importante problema para os teóricos do conhecimento (epistemologistas). Afinal, é ou não possível partirmos de experiência particulares para chegarmos a conclusões gerais, representadas pelas leis científicas?
Hume sustenta que a repetição de um fato não nos permite concluir, em termos lógicos, que ele continuará a repetir-se da mesma forma, indefinidamente.
Assim, revela o seu ceticismo teórico. Recomenda que os cientistas apresentem suas teses como probabilidades lógicas e não como certezas irrefutáveis.
Assim sendo, todo conhecimento da realidade carece de necessidade racional e entra no domínio da probabilidade, não do conhecimento científico.
Em oposição a essa corrente filosófica temos o racionalismo. A palavra racionalismo deriva do latim ratio, que significa razão. O termo racionalismo é empregado, na filosofia, de muitas maneiras. Aqui, o termo está sendo empregado para designar a doutrina que deposita total e exclusiva confiança na razão humana como instrumento capaz de conhecer a verdade. Ou, como recomendou o filósofo racionalista Descartes: nunca nos devemos deixar persuadir senão pela evidência de nossa razão.(ler trecho do livro Discurso do método – quarta parte, p. 95 – crítica aos empiristas)
Os racionalistas afirmam que a experiência sensorial é uma fonte permanente de erros e confusões sobre a complexa realidade do mundo. Somente a razão humana, trabalhando com os princípios lógicos, pode atingir o conhecimento verdadeiro, capaz de ser universalmente aceito. Para o racionalismo, os princípios lógicos seriam inatos na mente do homem. Daí por que a razão deve ser considerada como a fonte básica do conhecimento.
O texto mais famoso de Descartes, Discurso do Método, além de uma sumária exposição do método, ou das principais regras do método é, também, uma autobiografia de Descartes. Nesse texto não nos diz como devemos proceder para alcançar a verdade, mas como ele, Descartes, procedeu para alcança-la.
Descartes parte da dúvida chamada metódica, porque ela é proposta como uma via para se chegar à certeza e não é dúvida sistemática, sem outro fim que o próprio duvidar, como para os céticos. Argumenta que tais idéias em geral são incertas e instáveis, sujeitas à imperfeição dos sentidos. Algumas, porém, se apresentam ao espírito com nitidez e estabilidade, e ocorrem a todas as pessoas da mesma maneira, independentes das experiências dos sentidos, e isto significa que residem na mente de todas as pessoas e são inatas.
Na segunda parte do Discurso fica patente a prevenção, a desconfiança, em relação a tudo o que nos foi ensinado e que aprendemos à nossa revelia, antes de dispor do pleno uso de nossa razão. Suposição que já revela a essência do cartesianismo, a crença em uma razão intemporal, que seria possível restaurar em sua pureza e integridade, desde que dela fosse excluído tudo o que se deve ao ensino, à leitura, à educação. Confiando apenas na razão, na sua razão, individual e intemporal, Descartes acrescenta que, em relação a todas as opiniões que até então admitira o melhor que podia fazer era rejeitá-las, embora viesse a readmiti-las posteriormente, ou outras melhores, ou as mesmas, desde que “ajustadas ao nível da razão”.
Descartes foi levado a verificar que “o costume e o exemplo nos persuadem mais do que um conhecimento certo”. Método, como o leitor deve saber, significa, etimologicamente, caminho. Seguir um método corresponde, pois, a caminhar em direção determinada, quer dizer, com a consciência do fim a que se quer chegar.
Com tais preocupações procurou um método que, incluindo as vantagens da lógica, da geometria e da álgebra, evitasse, ao mesmo tempo, os seus inconvenientes. Formula, então, as famosas quatro regras fundamentais, que deverão desdobrar-se e multiplicar-se nas Regras para a direção do Engenho.
Primeira regra: evitar a prevenção e a precipitação, só aceitando como verdadeiras as coisas conhecidas de modo evidente como tais e não admitir no juízo senão o que se apresentasse clara e distintamente, excluindo qualquer dúvida.
Segunda: dividir cada dificuldade em tantas parcelas quanto seja possível e quantas sejam necessárias para resolvê-las.
Terceira: Conduzir em ordem os pensamentos, começando pelos mais simples e mais fáceis de conhecer, a fim de ascender, pouco a pouco, por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, supondo uma ordem mesmo entre aqueles que não precedem naturalmente uns aos outros.
Quarta: fazer sempre inventários tão completos e revistas tão gerais que se fique certo de nada ter omitido.
Aqui ele constitui o preceito metodológico básico – é que só se considere verdadeiro o que for evidente, ou seja, o que for intuível com clareza e precisão. Mas a ampliação da área do conhecimento nem sempre oferece um panorama permeável à intuição, e, conseqüentemente, adequado à pronta aplicação do preceito da evidência. Eis por que Descartes propõem outros preceitos metodológicos complementares ou preparatórios da evidência: o preceito da análise (dividir cada uma das dificuldades que se apresentem em tantas parcelas quantas sejam necessárias para serem resolvidas), o da síntese (conduzir com ordem os pensamentos, começando dos objetos mais simples e mais fáceis de serem conhecidos, para depois tentar gradativamente o conhecimento dos mais complexos) e o do enumeração ( realizar enumerações de modo a verificar que nada foi omitido ). Tais preceitos representam a submissão a exigências estritamente racionais. E justamente o que Descartes prescreve como recurso para a construção da ciência e também para a sabedoria de vida é seguir os imperativos da razão, que, a exemplo de sua manifestação matemática, opera por intuições e por análises.
Enfim, o importante e o que constitui o preceito metodológico básico apontado no Discurso do Método é que só se considere verdadeiro o que for evidente, ou seja, o que for intuível com clareza e precisão.
Após toda essa explanação podemos perceber as diferenças entre as duas correntes filosóficas: empirismo e racionalismo, duas vertentes em busca do conhecimento da verdade, cada qual por seu meio.
Com esse texto concluimos nosso modesto curso básico de filosofia, posteriormente estaremos postando sobre Kant, Hegel, Bachelard, Karl Marx, Nietzche e Heidegger e então daremos por concluido essa etapa. Boa Leitura.

3 comentários:

Anônimo disse...

necesidad de comprobar:)

Anônimo disse...

intiresno muito, obrigado

Anônimo disse...

Perche non:)